sexta-feira, 28 de março de 2008

MAIZENA

















Em 1977, vi pela primeira vez na TV manauara, uma propaganda falando dos conjuntos residenciais Mucuripe. Havia o Mucuripe I, o Mucuripe II e o Mucuripe III. Meu pai se animou em comprar uma casa e foi ver os conjuntos, que ficavam no Parque 10 mesmo, bem próximos ao Eldorado. Ele e minha mãe se agradaram do Mucuripe I, pois o II ficava numa ladeira ígrime e o III, ainda inacabado, próximo a um matagal.
Um belo dia, fomos ver a casa nova no Mucuripe I. O conjunto ficava na avenida Efigênio Salles, em frente a um outro conjunto também recente, o Jardim Itaóca. Quase ao lado do Mucuripe, ficava o Grêmio Guanabara, aquele da festa na piscina. Entramos com o Dodge Polara verde abacate de meu pai na rua calçada de pedras e o carro começou a chacoalhar. A princípio pensei que nossa casa seria logo a primeira, mas já havia um carro na frente. Continuamos a descer e eu já comecei a ficar puto porque nossa casa não seria a primeira. As casas passavam e nada de pararmos. Viajei um pouco neste momento, pois ao ver a rua do conjunto tão deserta, sem pessoas, lembrei daquela antiga canção de criança:

"Nesta rua, nesta rua tem um bosque
que se chama, que se chama solidão..."

Por fim, só para eu ficar realmente com raiva, paramos no fundo do conjunto, na última casa. Diga, qual criança quer ser a última em qualquer coisa? Saltamos e fomos ver a casa, que ainda estava em fase de acabamaneto. Transpondo o portão baixo, de tábuas de madeira, havia uma pequena passarela de blocos de pedra que terminava em um pequeno pátio. Depois do pátio havia um quintal. minha mãe já se alegrou:

_Olha esse quintal!

Eu, por meu lado, não via nada de mais em um quintal arenoso. Entramos e começamos a andar precariamente sobre as lascas de concreto que jaziam como um tapete de pedregulhos sobre o assoalho de azulejo. Minha mãe olhou para aquele ajulejado sujo e comentou o quanto ele era bonito. E eu, em minha cabeça de criança, me perguntava que merda de beleza os adultos vinham num chão sujo. Vimos os banheiros, de pias, vasos sanitários e bidês azul marinhos. Vimos os quartos, que meus pais comentavam ser de bom tamanho. Eram três, um deles era suíte. Por fim, fomos á cozinha, que minha mãe achou enorme e eu continuava me perguntando o que havia demais numa cozinha.
Depois disso, voltamos para casa e eu e Marcus já começamos a ficar alegres pelo simples fato de saber que íamos nos mudar para uma casa nova. A mudança por fim foi feita e nos alojamos na nova casa que, agora sim! arrumada e limpa, me parecia bonita. A única coisa que enfeiava eram nossos próprios móveis, que já estavam velhos e precisavam ser trocados.
Logo no primeiro dia, ao fim da tarde, minha mãe sentou-se em frente da casa, com um vestido longo, estampado, que ressaltava sua barriga de grávida. Estava ela na cadeira, quando se aproximou a vizinha da casa da frente. Ela era branca, bonita como a mulher do Leite Moça e também usava um vestidão, pois também estava grávida. Perguntou de quantos meses minha mãe estava e minha mãe disse que era pra outubro. As duas ficaram alí conversando "coisas de grávida", enquanto e eu e Marcus andávamos na rua, em frente de casa, começando a descubrir aquele novo mundo.
O novo mundo foi sendo descoberto aos poucos. Ao lado de nossa casa havia um terreno lamacento, que era à márgem de um igarapé. Sobre o igarapé havia uma ponte de madeira, que ligava á outra márgem. Na outra márgem, de terreno barrento e avermelhado, havia um galpão, onde se agrupavam os trabalhadores (e seu material: madeira, sobretudo) que ainda estavam de serviço no acabamento do Mucuripe II. Atrás de nossa casa havia uma pequena selva, que se estendia até o meio da Efigênio Salles.
Tudo era bem parecido com o velho oeste americano. Sabe aquele ambiênte agreste, que ainda está sendo desbravado... O cheiro de madeira nova que vinha do galpão do outro lado do igarapé. O vento fresco que batia à toda hora, sobretudo ao fim da tarde. O cri-cri-cri dos sapos que começava ao pôr do sol e o canto da cigarra, que parecia se espalhar por todo o horizonte. Lembro que eu olhava a ilustração do pacote da Maizena e viajava naquela aldeia de índios, que parecia estar num fim de tarde, graças ao amarelo da própria embalagem. Parecia até que estávamos vivendo naquele ambiênte.

4 comentários:

Ana Kaya disse...

não li direito o texto, dei uma passada de olhos como dizem. agora estou sem tempo e acho que só segunda feira vou poder comentar.
mas eu to falando, não precisa se preocupar, se depender de mim a gente vai conversar muito ainda aqui contando pedacinhos de nossas vidas.
segunda eu comento mais ta bom e o que mais tiver postado.
abraço e bom final de semana.

Ana Kaya disse...

maizena me lembra minha mãe fazendo brevidades pra mim quando eu era criança.
maizena lembra muitas infâncias.
maizena é patrimônio nacional.
Maizena faz tudo parecer fofo e gostoso.
Lembranças mil me invadem, mas ficam aquietadas em meu coração.

Oilson Lauro Hach disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Oilson Lauro Hach disse...

Numa época em que a oferta de imagens além da nossa percepção visual do ambiente em que viviamos eram raras, as informações vinham atráves dos rótulos de também raros produtos rotulados... Com certeza a cena tribal de Maizena foi a base do interesse antropológico de muita gente ao redor do mundo! :)